ARTIGO:
Legislativo - muito barulho e pouco resultado
Na aparência, perdemos todas. Na essência, avançamos mais do
que retrocedemos. O sentido de derrota, transmitido pela grande imprensa, não
pode esmorecer a resistência. Não se deve baixar a guarda. O campo da esquerda
precisa deixar suas diferenças de lado e lutar pelo essencial, que é evitar o
triunfo do discurso único.
por Antônio Augusto de Queiroz
Em geral, o início de
legislatura é sempre muito produtivo, mas 2015 ficou aquém da média, apesar da
percepção de forte ativismo dos presidentes da Câmara e do Senado.
O presidente da Câmara, que lidera uma agenda conservadora e
neoliberal, passou a impressão de ter tido grandes vitórias conclusivas. Quando
se analisa o resultado, porém, poucas dessas matérias foram transformadas em
norma jurídica.
As principais, na verdade, ou não tiveram ainda sua votação
concluída na Câmara, ou serão reformuladas pelo Senado, claramente por seu
conteúdo retrógrado, casos da terceirização, do financiamento empresarial de
campanha e da redução da maioridade penal.
O embate em torno dos temas em discussão, pelo seu caráter
polêmico, deixou a impressão de vitórias conclusivas das forças conservadoras.
A realidade, entretanto, é que as forças progressistas,
apesar de numericamente minoritárias, foram determinantes para retardar a
apreciação de algumas pautas socialmente atrasadas e criar no Senado um
ambiente político capaz de corrigir o caráter reacionário dessas proposições,
todas impulsionadas pelo presidente da Câmara.
Se analisarmos as propostas transformadas em normas
jurídicas entre janeiro e julho de 2015, constatamos, para a surpresa geral,
que houve mais avanços do que retrocessos, tendo em vista a correlação de
forças. Sob a perspectiva dos trabalhadores, podemos classificar as leis do
período em três grupos: neutras, positivas e negativas.
No primeiro grupo
pode-se mencionar as Emendas à Constituição que instituem o Orçamento
Impositivo e o aumento da idade limite para a aposentadoria compulsória de 70
para 75 anos. No grupo das leis negativas para os trabalhadores, e com seus
efeitos amenizados pela pressão sindical, destacam-se as que resultaram das
Medidas Provisórias do ajuste fiscal (664 e 665) e a Lei dos Caminhoneiros. No
grupo das leis positivas, há a flexibilização do fator previdenciário, a partir
da adoção da fórmula 85/95, a política de recuperação do salário mínimo e a
regulamentação do trabalho doméstico.
O grande desafio é impedir que no Senado sejam aprovados os
retrocessos chancelados pela Câmara e evitar que até fevereiro de 2017, quando
termina o reinado de Eduardo Cunha, novas ameaças aos direitos humanos sejam
votadas na Casa. Entre os riscos estão a PEC que reduz a idade mínima, de 16
para 14 anos, para ingresso no mercado de trabalho.
Os partidos de esquerda e os movimentos sociais já
resistiram a ofensivas neoliberais anteriores, como nos anos 1990, e
conseguiram evitar retrocessos. As forças progressistas precisam intensificar a
organização da resistência, denunciar e neutralizar as investidas sobre as
conquistas políticas, econômicas e sociais acumuladas desde a Constituinte de
1987/1988. Se acreditarem, tiverem unidade de ação e agirem organizadamente, os
defensores do interesse nacional, dos direitos humanos e das conquistas dos
trabalhadores irão, mais uma vez, derrotar as forças do atraso.
Para continuar na resistência, entretanto, é fundamental não
sucumbir ao desalento ou à desesperança em razão das crises política e
econômica. Ao contrário, deve-se utilizar, na luta parlamentar, os complexos
instrumentos do processo legislativo e, no campo político, explorar as disputas
de poder no interior dos partidos conservadores e expor as contradições e
interesses escusos das forças retrógradas, além de pressionar e mobilizar para
reverter essa conjuntura desfavorável, evitando que se consumem as ameaças em
curso no Congresso. Na aparência, perdemos todas.
Na essência, avançamos mais do que retrocedemos. O sentido
de derrota, transmitido pela grande imprensa, não pode esmorecer a resistência.
Não se deve baixar a guarda. O campo da esquerda precisa deixar suas diferenças
de lado e lutar pelo essencial, que é evitar o triunfo do discurso único.
* Antônio Augusto de
Queiroz é jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap.
Publicado originalmente na revista eletrônica Teoria&Debate de julho.
Fonte: Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar